11/24/2004

Uma decisão para toda a vida...

Este artigo foi escrito no dia em que o Presidente da República tomou a sua decisão acerca de conduzir o governo de Santana Lopes. É um protesto veemente e feito com o máximo de isenção que o momento me permitiu...

O Sr. Presidente decidiu...

Por muito que me custe, o Sr. Presidente já encontrou o seu caminho no embróglio criado por Sua Exa. o Sr. Primeiro-Ministro cessante. Cessante não, desistente. De-sis-ten-te...
Para mim, o verdadeiro fulcro desta questão, foi sendo gradual e habilmente afastado do Sr. Primeiro-Ministro demissionário, por pessoas que lhe são próximas e do seu governo, esse sim o último e único responsável pela “crise política” (chamo-lhe demissionário pois considero ser essa a condição mais condizente com aquilo que a figura sempre protagonizou).[1]
O falso fulcro, esteve, como a este regime interessava, na pessoa do Sr. Presidente da República. Jorge Sampaio, esteve e continuará no meio deste turbilhão e foi para lá lançado, sabe-se lá com que intenção.[2]
Pode dizer-se também, não sem uma grande dose de ironia, que o principal responsável pela crise que se instalou é de facto o povo Português, pelo menos a “minoria” que decidiu, num magnífico dia de praia, ir às urnas “penalizar” a coligação no Governo. Esta decisão, não só deu um cartão amarelo ao governo, como indicou que o PS voltara a ser a maior força política.
O susto não podia ser digerido, nem sequer engolido de uma só vez e enquanto Paulo Portas, no seu discurso de derrota, tentou desviar as atenções de todos para as diferenças enormes entre estas e as anteriores eleições (legislativas), Durão Barroso, magnânime, decidiu aceitar o óbvio dizendo que percebera a mensagem. É hoje claríssimo que de facto o Dr. Durão Barroso percebeu que a única mensagem a ser retirada de tão pesada derrota era a de um convite claro ao afastamento senão liminar da governação, então, pelo menos, da orientação programática e estratégica de governação da coligação.
Só que o grande peso desta derrota nas urnas foi conferido por uma das maiores votações de sempre alcançadas pelo PS, que mesmo em tempos mais áureos, nunca teve capacidade para destronar completamente o PSD, muito menos quando coligado com o CDS-PP. Isto abria caminho directo a uma reeleição do PS à frente dos destinos da nação, condição inaceitável quer por Durão quer por Portas.
A mensagem que Durão Barroso percebeu (ou quis perceber) e a que o país lhe deu, não pareciam a mesma. O “Adeus!!!” quase gritado dos Portugueses, foi ouvido como se de uma 2ª chance se tratasse e o Sr. Primeiro-Ministro, como lhe faltam exemplos de seriedade e anda na política para se servir, decidiu ficar, dizendo mesmo que se ia esforçar mais e continuar o “bom trabalho” que vinha a fazer, em dois anos e meio de poleiro.
“- Percebi a mensagem...”. Durão Barroso, proferiu esta afirmação infeliz. Algumas semanas depois teve o descaramento de, à laia de ladrão de ovos, se evadir de um Governo que ele próprio sabia estar condenado ao fracasso, pela franca diminuição de apoio popular que se verifica.
Como se essa falta de respeito lhe não bastasse, condenou duas candidaturas presidenciais na forja pelo seu partido ao fracasso – a de Santana Lopes, pelas razões óbvias, e, a de Cavaco Silva por razões mais obscuras, mas nem por isso ilógicas.
O PSD ficou também fragilizado e amachucado por dentro, pois a guerrilha, que se sabia apaziguada pela figura do líder incontestado José Barroso, ficou em chaga, logo que este anunciou a sua saída. Durão Barroso lançou, o PSD na progressiva derrocada, com a sua saída.
De líder, Santana Lopes tem apenas uma parca experiência e ninguém tão polémico jamais ficará incólume num partido tão tenso e gelatinoso como o PSD.
Santana Lopes está ainda com a sensação de quem está a atravessar o rio à vontade, mas já na mira dos seus adversários internos, que desde cedo vêm fazendo imensa pressão. Com apoios tão voláteis, o homem que da cadeira do poder mais importante do país teve apenas uma experiência televisiva, será obrigado a governar para o mesmo grupo de amigos que o convenceram de que seria a alternativa a Nogueira, depois a Marcelo Rebelo de Sousa e ainda a Durão Barroso, com quem disputou e perdeu liminarmente eleições em Congresso[3]. Também foi Santana Lopes o único político português que anunciou, já durante o 1º mandato de Sampaio, o abandono definitivo da vida política em Portugal (procurando quem sabe uma aberta na Europa), mas voltando logo de seguida como se de uma brincadeira se tivesse tratado.
O “enfant terrible” do PSD foi sempre considerado demasiado pueril e demasiado irresponsável para assumir qualquer cargo de relevo nacional. Foi-lhe “oferecida” a Câmara Municipal da Figueira da Foz onde fez um trabalho populista de tal modo notável, que um PSD sem esperança de vitória e tentando queimá-lo para batalhas futuras, permitiu que fosse candidato à autarquia de Lisboa, onde obteve a maioria à justa, mais à custa dos erros da coligação PS/PCP-PEV e do Governo PS, do que por seu mérito ou da sua candidatura. Desde essa altura, confrontado com a sua impressionante falta de soluções estratégicas para a cidade de Lisboa e tendo prometido tudo aquilo que era possível e muito daquilo que seria impossível (e ele sabia-o melhor do que ninguém), Santana Lopes decidiu começar a escapar-se à responsabilidade assumida com os munícipes e dar-se como candidato à Presidência da República.
Desde os tempos do PREC que Santana e Barroso se conheciam, um de direita (moderado q.b., ) e outro de extrema-esquerda. Se amigos eram nada dessa amizade parecia evidente quando no último Congresso do PSD (Viseu, 2000), o novo presidente se referia a Santana nuns termos algo afrontosos e pouco amigáveis, chegando mesmo a comparar o actual presidente de todos os “laranjas” a um “misto de Zandinga e Gabriel Alves”, aludindo à sua eterna condição de estranho à política maior e ao mesmo tempo profeta da desgraça. Mas o próprio Santana não deixou de “mimar” sobejas vezes o seu ex-oponente político, até que a sua eleição para Presidente da CML o catapultou para o estatuto de “enfant audible”. Até para si próprio dirigiu conselhos e mensagens, como por exemplo, quando disse que “o problema do partido [PSD] é que normalmente erra quando decide em circuito fechado”…
Nesta altura, Durão Barroso é um “estrangeiro” no próprio partido e corre alguns riscos. Se por ironia do destino, Durão Barroso viesse a ser considerado “inaceitável” pela maioria dos deputados do Parlamento Europeu e tivesse de refazer as malas ainda quentes da viagem de ida, já encontraria o novo Presidente instalado, com Governo criado e não dando hipótese de modificações até, pelo menos, ao final da legislatura. Outro grande risco é, servindo a sua vingança em prato frio, se o populista Santana conseguir piorar ainda mais a situação dos Portugueses, a ponto de deixar tanto o PSD como o CDS-PP numa situação de inelegíveis durante pelo menos 6 anos.
Tendo ainda como pano de fundo esta situação extrema, José Durão, não só teria jogado fora o Governo, como também o teria oferecido à pessoa que ele próprio considerava pouco recomendável.
Se Durão Barroso, quis pelos seus meios, limitar a acção de Santana Lopes, este está a preparar-se para se jogar a S. Bento com total empenho oportunista, tendo inclusive anunciado que pretende mesmo entregar os seus planos ministeriais ao PR antes da reunião que confirmará Durão Barroso no Concelho Europeu esta semana. Assim, por maioria de razão, poderá dizer-se que ambos estão pelas suas mesquinhas razões a “abotoar-se” com o poder da melhor forma que podem, estando ao mesmo tempo a minar terrenos e deixando a terra queimada, impedindo-se mutuamente de voltar atrás. Por outro lado, estão a fazê-lo com o país a assistir impávido, sereno e francamente descontente, pelo menos a meu ver. Se a legitimidade era já pouca, os tempos de incerteza que se avizinham e que cada vez mais temos presentes, vão dando a noção de que este é um Governo de gestão, mas para dois anos e meio.
Entretanto, outra personagem, se esconderá e manifestará pela omissão aquilo que deveras sente. Cavaco Silva, precursor da ideia “Carneirista”, de «um governo, uma maioria, um presidente», assim contemplando todas as possibilidades de poder, está neste momento a lamber a sua mais profunda ferida. A mágoa que sente, é a de uma pessoa que recusou sempre entregar uma pasta a um homem como Santana Lopes[4] e que vê agora como muito longínquas as possibilidades de ter deste o apoio e, portanto, do PSD para a sua eleição a Presidente da República. Assim, torna-se o homem mais presidenciável do país, num homem que provavelmente abdicará de sequer iniciar o processo de promoção junto do seu próprio partido. Ainda mais isto é fiável, quando, sem cerimónias se refere a Santana Lopes na sua apresentação da sua “Autobiografia Política Vol. II” como um homem deselegante, por insistir no tema das presidenciais a tanta distância, além de outros mimos no interior e de dar algumas indicações da razão de haver algum atrito entre os dois.
Na vida nada é definitivo excepto o términus. Cavaco que pretendia com o lançamento do seu livro, aliás francamente badalado como se disso houvesse felicidade para o país, criar em sua volta uma onda de apoio inabalável, mas ao mesmo tempo dando a conhecer algo sobre alguns políticos da praça que o próprio Cavaco vê como potenciais contendores às Presidenciais de 2006, foi, cirurgicamente distribuindo “apertos de mão”, pedidos de desculpa e recados a uns e a outros, que se os entenderam, proveito lhes faça.
Santana, agora na mó de cima, limitar-se-á a devolver toda essa ternura cavaquista e toda a frustração de ter sido o preterido, o eterno secretário de estado sem jeitinho nenhum, o tal que não viria a ser ministro, o aprendiz de populista e irá mostrar que é gente e que bate assim… Tem aqui a sua melhor oportunidade.
Para quem “nunca se engana e raramente [tem] dúvidas” Cavaco Silva, “[deixou] trabalhar” muito bem o seu pupilo Durão Barroso, para quem dirigiu todos os elogios e de onde agora vêm grandes e dramáticos problemas à sua candidatura a Belém.

Mas voltando à questão... acredito que o Dr. Sampaio foi lançado aos leões. Foi lançado e de que maneira, mas ao mesmo tempo foi usado, assim como foi sendo usada a Constituição, o documento que foi feito para nos proteger. O Sr. Presidente, deteve-se para pensar, com toda a propriedade sobre o assunto. Consultou variadíssimas pessoas cujo estatuto social, político e profissional ficam acima de qualquer suspeita e teria mesmo consultado todos os Portugueses e Portuguesas se isso fosse humanamente possível. Consultou tudo e todos, sem pressas e com uma ponderação própria das grandes figuras e disso se fez alarde na comunicação social, embrenhando o Dr. Sampaio cada vez mais na teia de uma decisão já ataviada, por diversas vezes e por diversas personalidades.
Imagino que tenha consultado diversas vezes a própria Lei, tentando descobrir-lhe nos meandros mais obscuros, algo que na sua lucidez pudesse justificar aquilo que ele sabia já ser impossível. Imagino que tudo tenha sido perscrutado pela sua mente.
O próprio Dr. Sampaio já estava fechado na jaula que ele próprio concebeu, numa justiça impossível...
Em livro que escreveu - “Portugueses” - Sampaio descreve as situações que para si são condição necessária e suficiente para a dissolução e convocação de eleições antecipadas. Nesse conjunto de condições, não coube, no entender de Sampaio, a situação actual, nem que para isso concorresse a maioria das vontades expressas pelas pessoas.
Para mim, o erro de Sampaio, tornou-se num Adamastor.
Ora, os Adamastores, embora sejam figuras míticas, têm o péssimo hábito de serem apenas transponíveis muitos anos depois de serem criados.
Este Adamastor é muito difícil de ultrapassar. Não quero com isto dizer que o governo que agora será convidado a prosseguir as políticas do malfadado e terminado Governo anterior (emanado como este de uma maioria não estável, mas comprometida e conivente e conveniente apenas a um pequeno grupo), sob o rigoroso escrutínio político do Sr. Presidente da República se eternize, mas o Adamastor criou-se e perpetuar-se-á até que alguém descubra nas leis aquilo que o Dr. Sampaio foi incapaz de perceber. Ou que não quis perceber. Que as leis feitas pelos homens, não são infalíveis, não são intangíveis, nem são meros exercícios de estilo dos legisladores. São fruto de um tempo, de um pensar e fazer colectivos, de condições políticas, económicas e de pessoas. Ao mesmo tempo as leis que temos, essas coisas inacabadas e imperfeitas, podendo e sempre sendo interpretadas de formas diferentes por pessoas diferentes têm no Sr. Presidente o garante de que aquilo que são é aquilo que delas é feito pelo Sr. Presidente. Mas isso também não garante, ou pelo menos não devia garantir, que a interpretação seja sempre a mesma, independentemente, daquilo que vai variando nas nossas vidas todos os dias...

Vejamos o que, de facto, está em cima da mesa:
1.Tivémos dois anos de um Governo, com uma maioria confortável para levar a cabo o seu programa. Nesses dois anos, esse mesmo Governo, foi o inimigo mais hostil da maioria que o elegeu e o mais fiel amigo de uma minoria, sobejamente conhecida pela sua grande capacidade económica.
2.Essa hostilidade esteve quase sempre patente. Vejamos... Foi, desde o início, objectivo do Governo agora demissionário, mais do que melhorar a vida de todos nós, fazer-nos acreditar que a culpa da “noite escura” económica em que todo o mundo estava mergulhado, era do bicho papão Socialista português. Por crer nessa patranha bem montada e ardilosamente conduzida, foi possível que o mesmo povo que elegeu por duas vezes um Governo Socialista (governando sempre com maioria simples), desse caminho à maioria (também simples) do PSD. O povo é inteligente. É sábio e justo, especialmente, quando aquilo que por detrás das suas razões se encontra é a esperança de que sangue novo traga novas soluções. O PSD que não sabendo o que fazer com uma maioria simples (nunca soube), logo tratou de trocar as voltas ao povo. Os planos do PSD, sufragados pelo povo, crente nessa mudança que se lhe afigurava necessária, foram combinados com os planos de outro partido, também sujeito a sufrágio na mesma eleição. Desse “lindo” casamento, com toda a pompa apareceu o Governo de salvação, cuja única e maior missão era matar esse enorme monstro que se chama “défice”, cuja cara se desconhece. E assim começou, numa noite calma e tranquila o Governo PSD/CDS-PP, o mais à direita desde o Antigo Regime.
3.Interessante é, também, pensar que numa eleição surgida pela demissão de um Primeiro-Ministro, apelidado de cobarde e mentiroso, acusado de saltar do barco, qual rato prevendo a desgraça, tenham surgido no poder precisamente aqueles partidos que exigiram a marcação de eleições antecipadas e que agora as recusam, invertendo os princípios que nessa altura invocaram.
4.Mais interessante, é pensar que as premissas que estavam na base dessas exigências, estão também hoje “em vigor”: continuamos com um défice monstruoso, com uma economia parada, com pouca justiça social, com pouco investimento privado, com pouca confiança dos portugueses e portuguesas na classe política, com pouca capacidade de arriscar, com uma economia paralela muito grande, com portugueses e portuguesas que vivem com pensões de sobrevivência, sem capacidade de endividamento, sem voz activa nos panoramas internacionais, sem estratégia de política externa, sem estratégia de política interna, sem recursos humanos especializados, sem empregos, sem oportunidades para os jovens, para os recém-licenciados, etc, etc, a lista é infindável... Temos até, poderão alguns afirmar, mais do mesmo; dos podres que tínhamos quando Guterres saiu.
5.Mas hoje temos ainda, mais desemprego, mais exclusão social, mais pessoas no limiar da pobreza, mais pessoas sem direito a segurança social, mais pessoas com menos perspectivas de futuro. Temos também maiores fossos entre os mais ricos e poderosos e os mais pobres. Temos um défice monumental, mas disfarçado por alienações do estado e do património de todos nós, cujos exemplos bastantes, surgem ainda por cima em contra ciclo com o que nos manuais de economia se prevê: “...em tempo de vacas magras não se vende, compra-se...”, mas quem sou eu...
À esquerda de Cinha Jardim, nada mais interessará e somos de facto o primeiro país do mundo a ser governado por um animador de discotecas, presença oficial em todas as festas. Os tempos que se avizinham serão pródigos em aventuras governativas e podemos provavelmente esperar que o Túnel do Marquês e o Parque Mayer sejam realidades e que outras questões puramente de ordem autárquica sejam empurradas pelo Governo.
Ao mais alto magistrado da nação, deixo a minha indignação, a minha pessoal discórdia e a minha intencional capacidade de boicote a este governo, que por todos os meios legítimos ao meu alcance irei desenvolver.
Ao mais alto representante do executivo, deixo as minhas felicitações e os votos de que todos os seus insucessos sejam o sucesso de Portugal. E não lhe digo vice-versa, pois penso que o seu sucesso com as senhoras em nada afecta o bom desempenho da economia portuguesa. Reconheço que nisso é ele bom…
[1]José Manuel Durão Barroso, ex-Primeiro-Ministro de Portugal, eleito por maioria apenas há dois anos e 2 meses, desistiu nitidamente de ser aquilo para que foi eleito. Resolveu pela fuga em frente, saltando de um posto gasto e para o qual demonstrou sempre uma grande falta de jeito, para um novo posto onde não só ganha mais dinheiro e garante para si e para os seus uma progressão de luxo de uma vida de “cherne habituado aos fundos marinhos” para uma vida de “faustos” privados e cocktails de caviar.
Antes de sair com um discurso breve de 5 minutos que não deixou saudades, mas antes, imensas perguntas por resolver e fazer, José Durão Barroso, mudou de nome, explicou-se com desculpas de mau pagador e foi-se, falando três línguas para que todos os portugueses o percebessem, ultrapassando-se a si mesmo na escala do chauvinismo, e depois saiu, mostrando aquilo que sempre foi a quem quis ver.
[2]Não haverá alguém interessado nisto tudo? Não haverá alguém que num misto de golpe palaciano e coisa legítima tente “roubar” a todos nós o que de nobre, sério e fundamental tem a política? Não haverá quem tenha, positivamente, sempre a ganhar, cada vez que o peso dos políticos e de quem faz política é diminuído por culpa ou dos mesmos e os torna mais inócuos na sociedade?
Não haverá quem beneficie com o facto de que quem ainda ficou com voz para gritar contra algo que é injusto para todos, depressa fique rouco, ou seja “integrado” na máquina a bem ou a mal?
A teoria da conspiração, a assustadoramente real e incomodativa sensação de que algo não ficou bem explicado... como se todos tivéssemos que comer e calar e mais nada, pois é isso que está na Lei e a Lei é superior à força das maiorias, mas não das minorias, que as vergam e quebram em estilhaços a um estalar de dedos. Tudo isto é muito triste e neste país é Fado, é vida e poucos sabem e vêem por cima do nevoeiro. Poucos levantam a cabeça para espreitar...
[3]Ainda todos se lembram quando no programa de Artur Albarran foi derrotado e recebeu um cheque de 600 cts. pela participação, perdendo a cadeira tão almejada contra o homem forte dos sindicatos de então Torres Couto
[4] Todos se lembram ainda dos cantos dos Lusíadas e dos Concertos para Violino de Chopin, que descobertos por este personagem constituem ainda hoje um dos mais grandiosos “flops” da política portuguesa, a par do “é só fazer as contas” de Guterres e do “Vamos todos gritar! Guterres, Guterres, …” de Valentim Loureiro…

11/17/2004

O perfume da traição

Fomos traídos.
Em 30 anos nada mudou. Nada de significativo. Mudaram as casas, as cidades, as ruas e os seus nomes, mas nada de significativo.
Continuamos a ser pobres e a ter poucos horizontes. Continuamos mesquinhos.
Continuamos fracos e oprimidos, perante o ardor de sermos mais fortes e o jugo a que a economia de escala e à escala do globo nos submeteu.
Em 30 anos evoluímos em números, mas diminuímos a nossa vontade de nos expressarmos pelos números.
Temos mais dinheiro e menos preocupações com os outros.
Temos mais riqueza e menos controlo sobre o que é nosso.
Temos mais poder e menos responsabilidade.
Temos mais amor próprio, mas muito menos capacidade de intervenção.
Em 30 anos, construímos uma sociedade mal preparada e pouco interessada no seu sucesso.

A culpa é toda nossa.
Em 30 anos vimos com olhar doce o ocaso das nossas glórias e a fugaz intermitência de conquistas duvidosas.
Em 30 anos dedicámos todo o esforço a, paulatinamente, sofregamente, sossobrar a pequenez a que estávamos forçados.
Em 30 anos nada de significativo aconteceu.

Ainda temos caciques, barões e mercenários.
Temos ainda pessoas capazes de tudo por um quinhão. Capazes de indignidade, desonestidade, falsidade, abuso de poder e confiança. Temos pessoas capazes de coisas para as quais não existe nome.
Em 30 anos não conseguimos livrar-nos dos politiqueiros, dos Monarcas de Província, dos aldrabões de 1ª apanha, que ardilosamente nos tramam e nos fazem "emprenhar pelos ouvidos". Não estamos safos dos mentirosos de 2ª que descaradamente se servem de curiosas distorções pessoais da verdade, para levar a bom porto a sua vida.

Eu penso muitas vezes, com agravo, sobre isto. Eu sinto-me pessoalmente atingido por isto. Eu não quero viver num sítio, partilhando-o com pessoas tão reles.
O meu país não pode ser o mesmo país destas pessoas. Eu não posso pertencer ao mesmo "clube" que estas pessoas.
Eu não quero contribuir para a melhoria das condições de vida destas pessoas. Eu não quero pagar impostos para que estas pessoas tenham médico, subsídio de férias Natal e refeição, estradas, aeroportos, teatros, hospitais e outras regalias que são para todos.
Eu já não aceito que as regalias sejam para todos. Nem as mordomias, nem os direitos.
Temos de encontrar a vergonha que alguns perderam e devolver-lha. Temos de lhes devolver a honradez, a capacidade de julgar e decidir justamente o certo do errado.
Não consinto que se consinta em aceitar a desfaçatez, a maledicência gratuita, a incompetência, a imoralidade. Não posso tolerar, nem tolero que se seja tolerante com a hipocrisia, a mentira, o abuso e a ignorância passiva.
Não admito a descridibilização de tudo o que é puro e tem nobreza, em detrimento daquilo que é vil e em prol de uma oligarquia semi-secreta e empossada por hábitos e costumes de antigamente e vivendo exclusivamente para se engordar a si própria. Nem aceito que esse modelo de vida se generalize a todos os locais onde exista a possibilidade de ter poucos a mandar em muitos. Tem de haver Nobreza e Responsabilidade. Tem de haver Lei. Tem de haver Moral. Tem de haver Valores e Princípios. Não pode haver apenas Liberdade.
Há isso tudo, mas ainda é preciso afirmar isso tudo. É preciso que todos se lembrem.
E depois há o meu país. Portugal...

O meu país tem de ter toda a gente que nele vive, interessada nele, mas mesmo interessada. Não pode estar sempre à espera.
O meu país é importante. Carece de zelo e respeito. Carece de ser bem tratado.Não pode ser sempre posto em último lugar de todas as preocupações pessoais de cada um.

O meu país precisa de todas as mãos e todas as cabeças que existem nele, que estão ou vão estar nele, porque o meu país não pode esperar mais.
O meu país está cansado de ser adiado.
O meu país está cansado de ser gozado.
O meu país está cansado de ser diminuído, consumido, agredido e amarrotado.
O meu país está farto de ser podre, pobre, menor.

O meu país não pode mais suportar a existência de pessoas que só pensam em si próprias.
O meu país não pode mais suportar a existência de pessoas que só existem e não se interessam, apesar de poderem.
O meu país está farto de ser só um chão para ser pisado e cuspido.

Eu sou o meu país. Eu "sou" farto de ter de coexistir com outros que odeiam e me odeiam.
Eu quero ser livre. E quero que me ajudem a ser livre.

Já chega de ser mal-amado.

Fiz uma pergunta a mim próprio. Para onde ir?
Encontrei só uma resposta. Para a frente, com toda a gente e por toda a gente. Por esta ordem.

Faro - virtualmente real...

Faro - virtualmente real...

11/16/2004

O que parece, é.

Em política, ou politiquezmente falando, o que parece, é.
Também socialmente, ou cientificamente, pelo menos do ponto de vista empírico, até que uma determinada solução cabal seja dada aquilo que é o conhecimento comum, ou comummente aceite pelos demais é tido como a realidade. Mesmo que essa, seja apenas uma baça imagem da verdadeira realidade, ou que aquilo que se julgava um pequeno e marginal fenómeno esconda dentro de si miríades de deformações ou acrescentos.
Em política local, o que parece, é, mas muito maior... O que quero dizer com isto é que, no domínio do conhecimento pessoal, quando a maioria das variáveis comportamentais estão estudadas por alguém, ou quando a sua "intuição" aponta caminhos de comunicação verosímeis, aquilo que é a imagem dada por alguém de coisa ou pensamento, mesmo que por interesse particular, ou pontual tenha sido veiculado, passa ter valor maior e portanto, é tomado como o todo das ocorrências.
Logo o que parece é multiplicado pela quantidade de vezes que pareça verosímil venha a suceder e tomado como reacção, à priori.
Este tipo de raciocínio a que infelizmente é muito difícil escapar, é, por vezes, tão forte, que chega a perturbar todo um colégio de pessoas, que, por influência ou interesse manifestam ter o mesmo conhecimento da realidade.
Toda esta introdução, serve para esclarecer, que muito embora, pense estar na posse das ferramentas que me permitiriam sair deste ciclo de vício, a que a nossa análise da realidade política nos obriga, me sinto também vulnerável perante essa quase força oculta, que ataca sem avisar.
Servirá também, para o leitor das entrelinhas, para dar o meu contributo a iluminar uma questão velha e caduca, de que na política (local, regional, nacional, mundial) só mudam as moscas e que o resto é sempre o mesmo, incluíndo o cheiro... Discordo completa e frontalmente deste circunlóquio. Esta é uma ideia perigosa, pois faz cair no mesmo saco em que estão mesmo as pessoas que por má índole ou prática, mesmo que negligente, a merecem, as pessoas que de facto sempre se impuseram por causas, nobres ou menos nobres, suas ou dos outros, importantes ou de somenos, mas com sentido e com apego.

Penso que também consegui explicar porque é que os políticos resolvem pelo pior dos motivos falar com palavras caras ou baratas, mas sempre de forma a que ninguém os perceba. Isso serve para que só mesmo entre eles as palavras ditas tenham sentido. Assim, ninguém poderá depois culpá-los de terem mentido, mas podem sempre agraciá-los com novas honrarias caso tudo dê certo, pois nessas alturas uma circunstante explicação é dada.

Quero que os políticos falem baratinho. Quero que usem frases curtas. Quero que figam tudo pausadamente. Quero que respirem ar e o devolvam ao ar e que não tentem falar como se da potência da sua voz dependesse a sua razão.
Quero que as pessoas estudem e aprendam e percebam o que os políticos dizem, pois chegará a altura em que todos sabemos onde queremos ir, mesmo que os políticos nos digam que se lá chega de tal modo ou tal forma, ou usando tal e tal método... Saberemos lá chegar sem eles ou com eles se falarem verdade...
Quero que nenhum político se aproveite do facto de ter algum resquício de poder, para influir mesquinhamente na vida de outrém.
Quero que os políticos falem abertamente como se a sua vida não dependesse dos votos que irão receber.
Quero que os políticos sejam principescamente pagos e que depois de um mandato saiam para dar lugar a outros.
Quero que os políticos saibam o que estão a fazer e não sejam pedantes ou autómatos.
Quero que sejam profissionais e que se não o forem se tornem.
Quero que se esforcem. Mais do que agora. Melhor do que agora.

E quero tudo isso... PORQUE EU PAGO TUDO, INCLUSIVÉ, AS CONTAS DOS QUE VOTARAM EM BESTAS, QUE FAZEM ASNEIRAS COM AS QUAIS TENHO DE VIVER 4 ANOS DE CADA VEZ!!!!!!!!!

11/12/2004

Um inverno de boas intenções...

Apetecia-me ter muito mais paciência do que aquela que tenho.

Um partido político é uma máquina de promoção de ideias em que são discutidas e apreciadas as alternativas que deverão ser submetidas a um rigoroso escrutínio antes de serem aprovadas.
Um partido político é um espaço de intervenção pública onde cada pessoa que dele faça parte, se sente uma peça do xadrez e não apenas uma opinião oca.
Um partido político é um instrumento de formação cívica, em que cada um a seu modo, contribui para mostrar aos outros como fazer mais pelos outros.
Um partido político é uma peça da sociedade e dela recebe as mensagens e sobre elas reflecte e depois esclarece toda a comunidade, emitindo opiniões "educadas" à luz de determinada convicção.
Um partido político é um local onde cada um de sua forma procura fazer melhor em cada dia, para que todos possam estar melhor em cada dia seguinte.
Um partido político é uma casa onde cabem todos os filhos e se presta atenção a todas as dificuldades.
Um partido político é um conjunto de pessoas que não pensam da mesma forma, mas acham que conseguem chegar sempre a soluções.
Um partido político é um espaço em que ninguém está a mais ou é colocado à parte pelos outros.
Um partido político é onde apesar de com opiniões diferentes todas as opiniões podem ser unas.
Um partido político é um sítio onde a opinião de alguém tem igual valor à opinião de outro alguém, mesmo que esse outro alguém não conheça ninguém.
Um partido político é a praça onde todas as pessoas conversam umas com as outras educadamente e em que todas as vozes se ouvem clara e cristalinamente.
Um partido político é um jogo de matizes de uma mesma tonalidade, sem passar nunca pelo cinzento imóvel, mas sempre pelo cinzento de mutação.
Um partido político está para o poder, como o passageiro está para o seu destino, só chegando lá depois de passar pelas mãos de todos.
Um partido político é como um pássaro só com uma asa que, de repente, constroi asas para muitos pássaros.
Um partido político é como uma canção sempre à espera de uma música, mas com muitas letras e muitas ideias boas.
Um partido político é tudo isto, sem tirar nem por, mas sem pessoas lá dentro.

Como pode então haver tanta discórdia e tanto veneno e tanto inferno por coisas causas e almas tão justas, como as que estão num partido político?

Como é que eu devo fazer para aceitar que pessoas sem princípios, sequer maus, possam usar os meus pés para andar e as minhas mãos para fazer e a minha cabeça para pensar por eles?

Como é que eu posso deixar que alguns poucos, muito poucos, sejam suficientemente fortes para pisar muitos, só porque nisso vêm uma oportunidade de comer mais, melhor, mais depressa e antes de todos os outros?

Como é que eu permito isto tudo, fazendo parte de um partido político?

Como?
Comendo um pouco do mesmo pão...


PS - De boas intenções está este inverno cheio.
As hienas riem-se tresloucadas. São as maiores caçadoras e seriam mesmo capazes de derrotar os leões, mas têm medo deles pois eles são maiores e mais possantes, embora menores em número.


11/11/2004

O que é estar à flor da pele?

é estar cansado de tentar perceber porque é que as coisas não são como deviam ser?

é fazer tudo com pouca margem de manobra?

é estar sempre no ponto tangente da sociedade?

é estar o tempo inexorável a correr entre o copo cheio e uma outra gota que cai implacável para o transbordar?

é estar sem a liberdade de não dizer aquilo que está para ser calado?

é lamentar o final de uma aventura cujo início não se pode adiar?

é ver as nossas estruturas ruir, como se de uma solução de continuidade se tratasse?

é verificar que não se está seguro, nem firme no chão de ventanias em que fomos pelos outros lançados?

é encontrar sentidos perdidos nas coisas feitas sem linhas condutoras?

é descobrir intenções ruins nas palavras doces de alguém?

O que é estar à flor da pele?
Responda lá a isto senhor presidente, se for virtualmente capaz!...

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